A LDB já assegura o uso de línguas e processos próprios de aprendizagem no ensino básico
A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que determina que os processos de avaliação educacional dos estabelecimentos de ensino e dos estudantes indígenas, na educação básica, no ensino profissionalizante e no ensino superior, respeitem as particularidades culturais das diferentes comunidades e povos.
De autoria do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), a proposta altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB – Lei 9.394/96). Hoje, a LDB assegura às comunidades indígenas a utilização de suas línguas maternas e de processos próprios de aprendizagem no ensino fundamental – que tem duração de nove anos, iniciando-se aos 6 anos de idade.
O texto estende a regra a toda a educação básica (dos 4 aos 17 anos de idade), e também ao ensino profissionalizante e ao ensino superior, assegurando ainda a essas comunidades processos próprios de avaliação. O parecer do relator, deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), foi favorável à proposta.
— A iniciativa encontra pleno respaldo na legislação vigente, ampliando aos povos indígenas a garantia de utilização de suas línguas maternas e de processos próprios de ensino e de avaliação da aprendizagem em toda sua formação, da educação infantil ao ensino superior, passando pela educação profissional.
Segundo o parlamentar, a educação indígena bilíngue, ministrada preferencialmente por professores indígenas, em escolas indígenas das próprias aldeias e comunidades, possibilita que o ensino escolar preserve as particularidades socioculturais de cada etnia, fundamental para a manutenção da organização social, costumes, línguas, crenças religiosas e tradições de cada grupo.
Tramitação
Agora, a proposta, que tramita em regime de prioridade, será analisada em caráter conclusivo pelas comissões de Educação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Os desalojados da utopia (artigo) |  |  |  |
15-AGO-2014 |
Artigo publicado em 15/08/2014 no jornal Gazeta do Povo (Curitiba)
Cristovam Buarque
É antigo o apoio aos desalojados por causa de desastres naturais, raro o apoio aos desalojados pelos modelos econômicos e sociais. Ninguém com sentimento humanista deixa de reconhecer o papel positivo da transferência de renda para abrigar famílias pobres, que ficaram desalojadas ou excluídas dos benefícios do progresso. Sem essa ajuda, elas estariam na mesma situação das vítimas das tragédias naturais. Mas falta humanismo naqueles que veem os abrigos como a solução para as dificuldades que as vítimas de tragédias atravessam ou naqueles que comemoram o aumento no número dos que vivem em abrigos, fugindo dos horrores da pobreza.
Essa visão predomina entre os que defendem as transferências de renda como solução para o problema da pobreza, sem a percepção de que os necessitados do Bolsa Família são desalojados e desabrigados pelo modelo econômico, que a transferência de renda busca mitigar sem eliminar a exclusão. Por isso, chamam de "beneficiados" e não de "necessitados" os desabrigados.
Na sua forma atual, sem escola de qualidade, o programa Bolsa Família está sendo um abrigo para proteger necessitados. Comemorar o aumento no número de pessoas que dele necessitam é igual a ver como solução definitiva o abrigo provisório para desabrigados por catástrofes.
A necessidade do Bolsa Família decorre da interdição histórica de um pedaço de terra para as famílias rurais, que foram desalojadas pelo modelo voltado para o mercado externo; ou devido à constante migração de pobres para as cidades em busca de emprego que não existe ou de baixos salários que não atendem às necessidades básicas. Deve-se também ao desvio de recursos para criar infraestrutura econômica e pagar juros da dívida que ela exigiu, no lugar de investimentos em serviços públicos - sobretudo educação de qualidade para todos.
Até recentemente, essas falhas do modelo econômico eram percebidas por aqueles que lutavam por um mundo sem desalojados sociais. O fracasso dos regimes socialistas desfez as propostas e as bandeiras de luta por uma economia comprometida com o social. No Brasil, a convergência desse fracasso com a ascensão da esquerda ao poder acomodou de tal forma os políticos que todos passaram a justificar as medidas mitigadoras como se fossem o limite possível da utopia. O Bolsa Família passou a ser visto como solução e não como abrigo provisório. E seus beneficiados, vistos como integrados ao modelo e não mais como desabrigados por ele. A aceitação do modelo, que desaloja os excluídos, desalojou as esquerdas, tirou-lhes o vigor transformador, acomodou-as na aceitação dos abrigos como se fossem o céu social.
Agora, nenhum candidato a presidente disse: "Enquanto uma família precisar, receberá o Bolsa Família, mas não descansarei enquanto o modelo social continuar provocando desalojados que precisam de abrigo provisório".
Cristovam Buarque, professor da UNB.
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